domingo, abril 27, 2008

FOME: A IRRACIONALIDADE



A dinâmica das noticias sobre a crise da alimentação no mundo, trouxeram aos mais novos a reflexão sobre a famosa tese dos fisiocratas do século XVIII, mas para a minha geração as palavras de Josué de Castro ecoaram na cabeça de forma retumbante com lembranças sobre suas teses e teorias que o conduziram à FAO. Porém em meados dos anos 80, um geógrafo francês, um militante ecologista nos apresentou um dilema maior sobre a sociedade humana, seu livro "Utopia ou Morte", nos apresentava uma realidade muito maior a nível mundial que somente Celso Antunes seria capaz de concordar.
A entrevista destacada abaixo é um esboço de suas previsões:

"O destino ecológico do Planeta será decidido no Terceiro Mundo.
Esta parece ser a ideia-força de René Dumont, que se afirma um « militante terceiro-mundista», quando lhe perguntámos que laços ainda o ligavam ao movimento ecologista francês.
Para ele, «a fome do Terceiro Mundo é, em grande parte, um desastre ecológico. Ao contrário da mentira que tantos ainda sustentam e que há 10 anos, na Conferência de Estocolmo, tomou foros de cidade - só os países industrializados teriam problemas de ambiente... - o subdesenvolvimento significa para René Dumont o maior atentado não só contra os povos mas também e principalmente contra a Natureza.
«A nossa fartura - diz, referindo-se principalmente à França - é baseada na miséria dos outros.»
Os chamados países «ricos», ao explorar e pilhar os recursos naturais dos colonizados, não só escravizam os povos como destroem os seus ecossistemas.
Para ele, a primeira oposição a estabelecer, para explicar a moderna Mega-Crise, é contra o «colonialismo», do que decorre a palavra de ordem necessária:
«Descolonizar o homem é antes de mais descolonizar a Natureza.»
Este «trota-mundos», em incansável peregrinagem pela Terra dos explorados e espoliados, está em boa posição para denunciar o inimigo principal:
«A ecologia resume todos os nossos problemas, todas as nossas crises», diz ele, pondo fim aos que ainda falam de «combater a poluição» ou em «defender o ambiente».
SEM FLORESTA SÓ HAVERÁ INUNDAÇÕES E SECAS
Ao enunciar os absurdos que explicam o «apocalipse» actual, Dumont torna-se torrencial:
«Em cada minuto, vinte hectares de floresta húmida tropical desaparecem, comprometendo assim uma componente essencial do nosso ecossistema. Dentro de 10 anos na Costa do Marfim, dentro de vinte e cinco na África Central, dentro de trinta na Amazónia, não haverá mais floresta. Com a destruição das florestas do Himalaia, do Nepal e da Índia, aumentam as inundações e as secas, como o pude verificar no Paquistão, no Bangladesh e na Índia.»
Quanto aos climas, de que depende. a produção agrícola, diz este professor de Agronomia:
«Também estamos a degradar os climas: por combustão excessiva de energia fóssil, produção de gás carbónico, radioactividade das centrais nucleares, kripton radioactivo, aumento de poeiras. Os óxidos de azoto atacam a camada de ozono que nos protege dos raios ultravioletas.»"


René Dumont, conhecido ecologista francês, que se encontra em Portugal, afirma-se actualmente um militante terceiro-mundista
[(*) Este texto de Afonso Cautela, entrevista com René Dumont, foi publicado no jornal «Portugal Hoje», 17-2-1982]